Quando eu crescer, quero ser Engenheira

Quando paramos pra pensar sobre o que é ser mulher em um espaço que somos minoria, espera-se que a maioria das falas sejam no sentido motivador, e algumas vezes elas realmente acabam sendo. Você que é mulher e está na Poli: quantas vezes você já ouviu que “estudar aqui é direito seu como de qualquer outro homem; você pode ocupar o lugar que você quiser, assim como qualquer outro homem; você é forte por estar em um lugar repleto de homens e que sempre foi dado como masculino”? Devem ter sido várias, o que de certa forma é positivo, mostra que, mesmo que de pouco em pouco, estamos conseguindo ocupar esse espaço que já foi muito mais masculino — se é que é possível imaginar. Mas isso é o básico, né? Poder ter os mesmos direitos quando saímos da escola e escolhemos a carreira que queremos ter. Ter um sonho de criança e poder seguir ele pra sua vida, sem ter que pensar nas complicações e dificuldades a mais que isso pode trazer, como os meninos fazem. 

 

Infelizmente o que parece ser trivial não é, e passa muito longe de ser. Atualmente na Poli menos de 20% do corpo discente é composto por mulheres. Então falas que simplesmente dizem que você pode estar nesse lugar significam muito. Ainda mais inspirador que isso é ver mulheres engenheiras, ocupando cargos de liderança, sendo tudo aquilo que você sonhou quando criança, é uma sensação inigualável. Não é só diversidade e representatividade, é ver que você pode fazer o que almeja por ter a mesma capacidade que qualquer outra pessoa e que consegue chegar lá mesmo com todas as dificuldades a mais. Toda a trajetória que uma mulher precisa passar pra chegar a uma carreira de engenharia, ou até mesmo de exatas, e ir para um cargo de liderança, é muito mais conturbada do que a trajetória de um homem que busca o mesmo destino. Não é só o famoso “você tem o mesmo direito de ocupar esse lugar”, é muito mais.

 

Essa é uma parte que não costumam falar tanto. Normalmente tudo gira em torno de “o lugar também é das mulheres” e não do “o lugar é das mulheres, mas a chegada é diferente”. Essa perspectiva diferente sobre a representatividade é comumente omitida, podendo criar uma falsa expectativa de que tudo será flores e você vai facilmente conseguir qualquer coisa. Requer muita garra. E é importante falar disso. Você que é mulher, assim como eu, que enfrenta inúmeras dificuldades no processo de chegar até o seu tão almejado sonho e que passa por trancos e barrancos que não imaginava: o problema não é seu, não é que você é menos do que as outras parecem ser, é que você não sabia que ia ter que lutar tão mais do que qualquer homem. A trajetória da mulher não é a mesma. Enquanto os homens simplesmente atravessam uma pista reta sem adversidade alguma, as mulheres enfrentam alguns obstáculos, tempestades e imprevistos — e o pior, isso é dado como normal.

 

Dentro da Poli infelizmente não é diferente. Mas você chegou até aqui e vai continuar com toda essa garra. Imagine como deve ter sido difícil pra primeira mulher na Poli, que se formou em 1928, 35 anos após a fundação da Escola. As coisas melhoraram um pouco, temos mais mulheres e mais representatividade. E temos que continuar lutando pra que esse espaço continue a ser nosso e pra que o caminho melhore um pouco, pra nós e para as que vierem depois de nós. 

 

Quando se é mulher, não exclusivamente em um espaço de engenharia, nada é só uma escolha, só uma decisão, tudo é mais um desafio e mais uma barreira — parece que o mundo não foi pensado pra nós, e, mesmo assim, continuamos invadindo todos os seus espaços e lutando pra ficar. Que no futuro a Engenharia seja um ambiente mais igualitário, com um mesmo caminho pra todos que quiserem segui-lo. 

 

O Dia da Mulher na Engenharia surgiu com o propósito de continuar inspirando meninas a seguirem uma carreira em engenharia, para motivar cada vez mais mulheres. Ainda há muitos obstáculos, mas com mais representatividade, melhor fica o espaço e vem uma maior participação feminina: um processo que se retroalimenta. Por um futuro em que o básico possa ser trivial e qualquer mulher possa sonhar com engenharia sem ter que se limitar por dificuldades e caminhos mais árduos, onde seja normal ouvir uma menina falar “Quando eu crescer, quero ser Engenheira” sem que seja motivo de preocupação. Pelo dia em que estudar na Escola Politécnica seja nosso direito como é de qualquer outro homem.

 

Fernanda Quelho,

Engenharia Mecatrônica, 3º ano.

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