O Politécnico viu: Relatos Selvagens

Relatos Selvagens é um filme composto por 6 brilhantes episódios de vingança que apresentam, sob diferentes perspectivas, os impulsos (muitas vezes brutais) comuns a todos nós. Colecionar inimizades, guardar rancor, a constante busca por ter a última palavra, tentativas de manipulação, fuga do sentimento de impotência e o desejo de “dar o troco” são nossos velhos conhecidos e  apresentam-se de maneira nua, crua e criativa no(s)  enredo(s). Com sutilezas e absurdos a obra passeia pelo drama, ação e temas que instigam boas reflexões. No fim, há até certo tom cômico… Será que quem ri por último ri melhor? 


O primeiro ponto que me chamou atenção no filme é a naturalidade do extremo, desde o plano mirabolante de reunir todas as pessoas que, na visão da pessoa, prejudicou na vida até uma briga onde um quer matar o outro só por causa de um xingamento que é comum no trânsito, mas que prepara o público as próximas histórias. 

 Um enorme destaque ao trabalho de conseguir com tempo menor, exceto no arco “O mais forte”, nos identificar com os personagens e, bem no fundo, querer ver o circo pegar fogo, pois esse absurdo acaba sendo apenas ficção, né Eike? Aliás a briga de trânsito seja a exceção positiva (mas a mais fraca), pois ambos os personagens são desprezíveis e torcemos para o fim de ambos (pelo menos foi comigo).

Com diferentes arcos, o filme aproveita para utilizar diferentes elementos e gêneros, variando de um mirabolante plano que daria inveja a muitos vilões de espião até uma versão mais simples da piada mortal (e sem o Batman), desde ambiente desértico com cores vibrantes até uma escura e chuvosa lanchonete.

O filme corrobora com a visão de contrato social? Ao longo do filme me perguntei sobre e até parecia que sim, mas o último arco me fez questionar essa visão (não vou entrar em detalhes para evitar spoiler). No fim acho injusto separar o filme em 6 história separadas e assistir despretensiosamente uma ou duas (principalmente os arcos iniciais), pois para aceitar certos exageros nos arcos finais é preparado pelos relatos iniciais.

 

Nota: π² + e – ln 26,21 ± 0,07
Maikon Yukio,
Engenharia Civil, 4º ano.


A principal dificuldade de um filme de contos é manter sua homogeneidade. Assim como Tétis segurou Aquiles pelo calcanhar ao banhá-lo no rio Estige, uma antologia precisa ser ancorada a partir de algum ponto. Não necessariamente temático, tampouco narrativo, mas é preciso haver alguma espécie de fio-condutor da obra. As virtudes de cada história não podem competir entre si, muito menos redirecionar o foco do público; caso contrário, a coletânea tem sua estrutura rompida e deixa de fazer sentido como conjunto. Nesse sentido, Relatos Salvajes acerta em cheio. O pior conto do longa ainda é muito, muito bem trabalhado.

Para isso, o filme conta com montagem e ritmo espetaculares. O diretor sabe exatamente a hora de ser expositivo e o momento certo de deixar o espectador ligar os pontos. O exercício mental de tentar organizar os seis contos em outra ordem é extremamente difícil. Parece que tudo está no seu devido lugar.

Não há como imaginar a obra iniciando com um conto diferente, por exemplo. Aliás, os oito primeiros minutos do longa já valem o ingresso. A maneira com que a tensão é gerada, a partir de uma conversa casual entre dois estranhos, é fascinante. Da mesma forma, o longa não poderia terminar com outro causo. Ou, então, deixar de ter a narrativa do advogado sucedendo a do engenheiro. Acredite, não era uma decisão simples. Há 720 arranjos possíveis de histórias. A probabilidade de se escolher a ordem exata era de 0,1389%. E, mesmo assim, o filme acerta na mosca.

Os contos se relacionam muito bem entre si. Há uma escalada em alguns aspectos – o exagero, por exemplo, é crescente. E, tão importante quanto isso: as histórias do cotidiano dos personagens se conectam fortemente com quem as assiste. No decorrer do longa, o público tende a deixar de censurar o exagero brutal que se passa em sua frente, e passar a participar dele, a ser seu cúmplice. Isto é, o espectador desiste de censurar o absurdo dos contos e se vê tentando antecipar o que vai acontecer, conjecturando qual seria o absurdo mais coerente a se seguir. Nesse momento de escapismo e de aceitação, a obra atinge seu ponto máximo.

Primordial para isso, há uma fluidez impressionante para navegar pelos mais diversos temas. Com uma pitada de surrealismo, o filme trata de ganância, privilégio, vingança, relacionamentos, corrupção estrutural… e faz tudo isso passeando por gêneros como suspense, comédia, tragédia – com um contraste impressionante entre os dois últimos -, chegando até a flertar com o horror. Deliciosamente cínica, sabendo, também, ser sombria quando necessário, a obra consegue extrair graça do extremo absoluto da irracionalidade humana.

É uma das melhores sátiras sociais da história recente do cinema.

Nota: 9,4
Mateus Pina,
Engenharia Mecatrônica, 1º ano.


Muito enobrece o homem sentir-se especial. Logo cedo no colégio, aprendemos o que diferencia o humano dos demais seres: sua razão. Contudo, terei razão ao dizer que todos temos aquele momento em que perdemos a cabeça para nos aproximarmos daquele  latente animal primitivo pulsante em nossos interiores. Relatos Selvagens capta a essência animal humana e a traduz em 6 histórias que brotam do lodo banal e desabrocham no ápice dos instintos. 

A obra argentina vai além do envolvente: o telespectador mergulha no seu próprio interior ao ver seus secretos desejos sendo levados ao extremo. Todas as histórias, apesar de não serem diretamente interligadas, relatam o triunfo da vingança, que ora se dá  por meio de uma violência animalesca, ora pelo esmaecimento da linha tênue entre loucura e sanidade.

Pela intercalação de realidades ordinárias com histórias que beiram o absurdo, o público desnorteia-se em um labirinto de emoções. Até que ponto somos meramente racionais? Existe tal ponto?

Recomendaria veementemente, assistir ao filme com áudio original, assim você poderá aprender os xingamentos exclusivos do castelhano, mas acima de tudo, terá acesso aos emocionantes sons de uma vida explosiva (que na enfadonha realidade não são liberados).

Em suma, o filme é uma ficção realista, um drama pouco comedido e estranhamente cômico, uma harmonia de extremos que converge ao título da obra: Relatos Selvagens delata com brilhantismo a selvageria orgânica da nossa humanidade.

Nota: 9,953
Veronica Duval,
Engenharia de Produção, 1º ano


Já sentiu aquela vontade extrema de derrubar um vaso antigo, responder uma ofensa na rua ou até mesmo cometer um ato de vingança? Toda essa sensação de de uma raiva reprimida, de um balão cheio de sangue prestes a estourar ainda incrementada pela ótica da ilegalidade (ou de simplesmente estar fazendo algo de errado) é o que caracteriza os “Relatos Salvajes” descritos nessa obra.

O mais valioso do filme é a precisa descrição dos sentimentos. Todas as motivações dos personagens são humanas, e portanto compreensíveis(o que não as torna justificáveis). A profundidade dos personagens faz com que seja quase impossível não se envolver nas histórias, e mais do que isso, é extremamente fácil de se enxergar nelas.

Talvez ainda mais profundo do que isso, o filme é capaz de reproduzir com perfeição alguns dos estímulos mais primitivos humanos. No final das contas são alguns sentimentos, alguns gritos internos e alguns dilemas que nos trazem a verdadeira lembrança de que não somos apenas seres racionais, mas também emocionais.

Com tudo isso em vista, é válido afirmar que “Relatos Salvajes” é não só uma crítica sarcástica a todo o modelo da sociedade, como também um retrato único da psique humana. Além de todo o cenário social, o filme reproduz com perfeição a sensação de adrenalina ao não ligar para as consequências e de verdadeiramente “se sentir vivo”

Então quebre o vaso milenar da sua vó, grite mais alto quando algum desconhecido te perturbar, arrisque-se, Viva. Você prefere botar tudo a perder a troco de criar cores no mundo, ou restringir a sua vida a um cinza por medo de Viver?

Nota: 9,0
Rafael Varanda,
Engenharia Mecatrônica, 1° ano.


Uma mistura de “O que você faria em 20 segundos de coragem insana?” com o Coringa, Relatos Selvagens consegue te manter por quase duas horas com os olhos pregados na tela a partir das situações bizarras que ocorrem nas seis histórias independentes. Como o nome indica, o que as une no filme é a selvageria, o animalescol nas ações humanas que, ainda que “bizarras”, não são absurdas. Isso fica mais claro conforme as histórias mostram diferentes faces dessa brutalidade. Por essa razão, leitor, não ache que as seis histórias poderiam ser curtas ou que você possa assistir o filme picado: a obra de Szifron na sequência apresentada é o fator de excelência de Relatos Selvagens.

Nota: g
Arthur Belvel,
Engenharia Mecânica, 2º ano.

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