Escrito, dirigido e produzido por Spike Jonze, Her (Ela, 2013) conta a história de Theodore (Joaquin Phoenix), um solitário escritor que está se divorciando de Catherine (Rooney Mara) e começa a desenvolver uma relação romântica singular com seu sistema operacional, uma entidade sensível que se autobatiza de Samantha (Scarlett Johansson). Situando-se em um futuro não muito distante, a obra mistura ficção científica e drama, em um agridoce conto sobre amor, isolamento e conexão. Ao todo, Her foi indicado a cinco categorias do Oscar, incluindo a de melhor filme e a de melhor roteiro original (única estatueta conquistada).
Segundo a própria sinopse oficial do filme, Her “explora a natureza do amor e as formas como a tecnologia nos isola e nos conecta”. A obra questiona o que é um relacionamento em sua essência. Afinal, poderia Theodore realmente ter se apaixonado pela voz de seu sistema operacional? Até que ponto aquele sentimento de preenchimento, de completude, era autêntico? Por outro lado, e em relação à Samantha? Existe algo de genuíno no afeto demonstrado por ela? Vou além: qual o nível de controle que os responsáveis por esse programa teriam sobre seus usuários? Ou, ainda, não seria a história de Her baseada em apenas mais um sentimento artificial, emulado, como nas centenas de cartas escritas por Theodore?
Mas será que alguma dessas perguntas realmente importa? Fato é que, indo do fofo ao constrangedor, Her instiga o espectador a ponderar sobre cada uma delas, sem tentar respondê-las de maneira definitiva.
Relações afetuosas entre humanos e máquinas vêm sendo abordadas no cinema há muito tempo, em filmes que vão desde o clássico Blade Runner até o recente Ex Machina, por exemplo. Ainda que o tema principal da maioria das obras de ficção nem sempre seja esse, a questão tende a ser explorada, de um jeito ou de outro. Nesse sentido, Her se destaca justamente por transcender a superficialidade no modo em se abordar o tema. Trata-se de uma obra extremamente complexa — não por ser de difícil compreensão, mas por permitir novas reflexões a cada sessão.
Para tanto, a mistura entre os gêneros drama e ficção científica é precisa: o primeiro garante ao filme um tom irresistivelmente melancólico; ao passo que a atmosfera futurista permite que se tome liberdades tecnológicas sem se desconectar de aspectos do presente (e até do passado), proporcionando uma ambientação familiar ao espectador. Dessa forma, todos os elementos cinematográficos que compõem a obra ajudam a contar essa história com bastante coesão. A fotografia entrega planos muito inteligentes, com uma encantadora composição de paletas de cores. Por meio de uma direção primorosamente simples e um ritmo apropriadamente lento, Her tem um tom metafórico, e, durante o espaço entre suas palavras, o excelente roteiro permite que o espectador reflita suas proposições juntamente com o protagonista e sinta suas emoções com ele. A melancólica trilha sonora, o silêncio das cenas contemplativas… esses espaços são essenciais para que a história seja contada.
Além disso, a ironia é outra ferramenta muito bem utilizada pelo roteiro. Theodore trabalha escrevendo cartas para clientes que desejam expressar seus sentimentos por alguém, mas não conseguem; ao passo que ele não é capaz de lidar com suas próprias emoções. Theodore chega a concluir que já sentiu tudo o que deveria sentir e que não sentirá mais nada de novo, somente versões menores do já sentiu. Aliado a isso, há uma clara idealização e supervalorização de sua relação com Catherine, comprovando sua própria tese de que “o passado é uma história que contamos a nós mesmos”. A instabilidade emocional do protagonista é clara, e ele quer manter essa ilusão. Ao mesmo tempo, Theodore busca preencher o espaço deixado por Catherine, mas apenas o suficiente para se satisfazer de maneira transitória, como exemplificado por seu encontro com a personagem de Olivia Wilde. Ele deseja manter esse sedutor vazio, em um ciclo vicioso, no qual a distração momentânea fomenta a solidão existencial eterna do personagem. E é só no final de toda essa jornada que Theodore consegue, então, romper com esse ciclo.
O filme faz, sim, uma dura crítica às relações líquidas presentes na sociedade quase distópica criada, além de abordar as relações entre humanos e máquinas e de tratar sobre outro punhado de coisas. Contudo, Her é muito mais simples do que isso. O longa começou a ser produzido em 2003 — ano em que Jonze se divorciou de Sofia Coppola (diretora e roteirista de Lost in Translation, também de 2003 e que possui clara relação com Her) — e demorou dez anos para finalmente vir a público. É uma obra extremamente pessoal e que se liga diretamente à vida do diretor, que, assim como Theodore, conseguiu, enfim, escrever sua própria carta. O cerne do filme é a superação. Trata-se de refletir sobre os arrependimentos e tudo o que se deseja se desculpar, sobre toda a dor causada um ao outro, além de se reconhecer a mútua ajuda no processo de se tornar quem se é — bem como o carinho e a gratidão eternos por trás de tudo isso.
Her é uma carta de amor.
Nota: 9,4
Mateus Pina,
Engenharia Mecatrônica, 1º ano.
O primeiro ponto é a visão do “futuro” que poderia vir, muitas das tecnologias apresentadas já são realidades e até comum no nosso dia a dia. Nessa visão de mundo parece ser mais positivo do que a nossa realidade, mesmo trazendo o isolamento causado pela tecnologia não parece existir toda a desinformação e as bolhas sociais.
A história trabalha com o Theodore e, mesmo sendo retratado como alguém que compreende e externaliza os sentimentos dos outros, está preso ao seu antigo relacionamento e apresenta enorme dependência de um relacionamento.
A discussão do filme, mesmo discutindo um tema já abordado em diversas histórias, consegue, no primeiro momento, se frustrar com o protagonista, sentir desconfortável com ele, ter enorme empatia com ele e, ao desenrolar do relacionamento entre Theodore e Samantha, admirar “química” do casal e, no fim, questionar o que foi apresentado.
Mesmo sendo apenas um filme de ficção, parece caminhar para essa realidade (se já tem casamento com personagem) e o final disso ninguém sabe.
Nota: 7,3
Maikon Yukio,
Engenharia Civil, 4º ano.
“Her” é do tipo de filme que te faz pensar mais depois de assisti-lo do que durante. A complexidade envolta na história dos personagens, na maneira em que as coisas acontecem e até mesmo nos sentimentos que elas te provocam são suficientes para tirar várias noites de sono. Até mesmo a sua própria opinião sobre o filme é volátil, te fazendo odiá-lo em algumas partes, e o admira-lo em muitas outras. A verdadeira chave está no ponto em que o filme não é uma história feliz, e muito menos agradável. A reflexão e o aprofundamento emocional propostos por ele é o que faz valer a experiência de assisti-lo.
Se a história pudesse ser descrita em apenas um adjetivo, seria com certeza “desconfortável”. Existem diversas cenas grotescas, não por brutalidade gráfica ou apelação, mas sim pela lenta desconexão com a humanidade experienciada pelos personagens. As cenas mais “felizes” ou “fofas” do filme, em minha opinião, são as mais brutais. É como se uma tragédia fosse descrita de um ponto de vista ingênuo, quase infantil.
Mas fora isso, com certeza o que mais me incomodou em “Her” foi a identificação com o protagonista. A empatia e subsequente conexão com suas emoções provoca uma agulhada, te obrigando a repensar sobre maturidade e humanidade no geral. Quanto mais se pensa sobre o filme, mais se tem a certeza que o mesmo é um soco no estômago, uma lição do quão é difícil amar e enfrentar a solidão.
Assistir duas horas de alguém arranhando uma lousa com as unhas talvez ainda seria mais confortável do que enfrentar a amargura proposta por “Her”, mas com certeza a edificação e a reflexão propostas pelo filme vale uma chance. A interpretação, o roteiro e a maneira que a história é contada são impecáveis, e acima disso, a lição trazida é linda, apesar de dura. Não é um filme que eu recomendaria a alguém que está passando por problemas pessoais (especialmente amorosos), mas mesmo assim, a essência do filme é única.
Nota: 7,9
Rafael Varanda,
Engenharia Mecatrônica, 1° ano.
O que é o amor? Se a questão estivesse em um papel, infantis desenhos de corações vermelhos dariam conta do recado. Por sua vez, o filme “her”, ensaiando também uma resposta, enverga para o mesmo lado, ao selecionar cuidadosamente uma paleta de cores avermelhadas permanente na obra. Imageticamente, “her” deslumbra: o vermelho impactante da capa de divulgação alastra-se pelos corpos e faz-se até presente nas delicadas mechas de cabelo dos atores. O vermelho está por toda parte, estaria também o amor?
O filme poderia tratar sobre o tema romântico buscando apenas a beleza visual e o conseguiria, tendo em vista seus belos cenários e o forte elenco. Contudo, a obra se arrisca na emergente questão da inteligência artificial e cai na comum humanização da máquina. Você, caro leitor e, também, espectador, já sabe os caminhos desse enredo: surgirá emoções entre um indivíduo e uma inteligência artificial, você se questionará sobre a autonomia das máquinas modernas, mas acabará se confortando, novamente, ao lembrar que a evolução tecnológica ainda não atingiu tal nível (se é que um dia atingirá). Assim, da previsível história, resta apenas a questão do amor e, ainda, na tentativa de tratar sobre esse sentimento, o filme peca, mais uma vez, por recorrer a frequentes apelos sexuais, e limitar a vastidão do amor a uma ínfima parte.
Então, voltando à pergunta inicial, o filme teria sido mais feliz se optasse por tratar o tema com maior apego aos singelos corações vermelhos e à grandiosidade representada.
Nota: 6,33
Veronica Duval,
Engenharia de Produção, 1° ano.
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