Sou bi, e daí?

Capa da revista

Eu lembro quando era bem mais nova e fui a uma banca de jornal comprar alguma coisa. Sabe, sempre foi fácil para mim esquecer de fatos, mesmo que importantes, por isso não vou saber te dizer o que eu fui comprar. Mas, curiosamente, lembro com nitidez da capa, a Ana Carolina estampada na lateral, o fundo rosa, a frase grande “Sou bi, e daí?”. E eu era muito nova para entender. Na ingenuidade, fui pesquisar e encontrei algo sobre ser bicampeonato. Fazia sentido, talvez fosse uma competição musical.

Mas isso nunca me incomodou tanto quanto tem me incomodado. Se eu perguntasse sobre a sexualidade da Ana Carolina hoje para todas as pessoas que eu conheço, posso arriscar que pelo menos metade diria que ela é lésbica. Isso sendo otimista. Algo similar ocorreria se fizesse a mesma pergunta sobre o Freddie Mercury, afinal, qual a dúvida de que ele é gay? Ou o Renato Russo. Não importa que eles estampem capas de revistas ou falem abertamente. Não importa que escrevam músicas dizendo “e eu gosto de meninos e meninas”. Simplesmente não faz a menor diferença.

Sinto com muita frequência que ser bissexual é estar sob um constante manto de invisibilidade ou em uma cabine à prova de som em que não faz diferença o quão alto você grite ou tente se afirmar, o mundo escolhe ignorar. E mesmo que a opinião geral signifique menos que nada para mim (o que, honestamente, está bem próximo de acontecer), isso molda uma realidade. Em que jovens bissexuais entram em conflito; em que a heterossexualidade compulsória, que pasme, afeta tanto a bissexuais quanto a homossexuais, é tão sutil quanto profundamente agressiva; em que pessoas só conseguem lidar com o fato de não terem o afeto completamente direcionado a um gênero depois de mais de 40 anos de vida, porque os estigmas sociais foram esmagadores demais para que elas pudessem abraçar a própria sexualidade.

Com tudo isso é fácil entender por que se fala em invisibilidade bissexual em pleno 2022. Porque os personagens que nos representam têm que se afirmar constantemente em suas próprias narrativas para que não dê para esquecer. Porque personalidades famosas que nos representam têm sua autoafirmação completamente ignorada. Porque não conseguimos encontrar nossa própria identidade em meio a tribos (meu deus, que palavra antiga) de sexualidade. Afinal, qual é o marco bissexual? Usar sapatênis com uma camiseta da Madonna?

E sim, eu fico um pouco brava, porque não é justo. Mas, como diria a Ana Carolina: Sou bi, e daí?

Escrito por Yasmin Ramos de Azevedo
1ºAno Engenharia Civil

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