Mulher na engenharia: além da estatística

As mulheres constituem aproximadamente 50% da força de trabalho no Brasil (de acordo com a Pesquisa Nacional de Amostras por Domicílio). Mesmo com os altos índices de desemprego, cerca de 54,4% das mulheres brasileiras com mais de 15 anos exercem atividade remunerada, segundo dados do IBGE. O tempo de horas semanais dedicadas a atividades domésticas é quase o dobro na rotina de mulheres em relação a homens, segundo dados da Pesquisa de Estatística de Gênero de 2019. O mesmo levantamento constatou que o salário das mulheres em cargos operacionais é de 77,7% do montante recebido pelo gênero masculino, dado que se agrava quando a função exercida é de liderança, chegando a 61,9% dos rendimentos obtidos por homens. Do corpo de 960 mil inscritos no Conselho Federal de Engenharia e Agronomia, uma parcela ainda minoritária de 18% é composta por mulheres.

Hoje, 23 de junho, é o Dia Internacional da Mulher na Engenharia. Abordar números, mesmo que significativo, não diz nem metade do que há para dizer. Isso porque as estatísticas são só um lampejo do que o cotidiano invisível das milhares de mulheres que são ou serão engenheiras abarca. Intentar ser engenheira carece de provas constantes para tudo e para todos de sua capacidade. As barreiras para consubstanciar-se ao mercado da tecnologia e da construção civil, ainda quando veladas, aparecem até para a mais eficiente profissional. Alguns tópicos causam esgotamento com a simples menção, como assédio moral e sexual, falta de oportunidades, sobrecarga das múltiplas responsabilidades que a vida adulta implica desigualmente aos gêneros. A despeito disso, falar das dores também não é o suficiente. 

Mesmo que a presença masculina ainda seja em muito majoritária nas universidades e empresas quando o assunto é engenharia, o crescimento da densidade de mulheres é notável. Muitas mulheres hoje ocupam posições inimagináveis há pouco menos de uma década, talvez. As primeiras aparecem. Primeira mulher em uma diretoria na Comgás, primeira mulher diretora da Escola Politécnica, entre tantas outras primeiras. E, hoje em particular, é primordial lembrar que, sobretudo, conquistar espaços é uma luta diária. Para que haja a segunda, a terceira, a enésima mulher até que listar nomes seja inviável. Para que tão somente a eficiência seja critério de ascensão profissional. Para que se possa olhar ao redor no trabalho ou na faculdade e se sentir completamente parte. É luta para construir novos números e novas realidades. E a luta é nunca deixar que essa História que vivemos seja esquecida ou apagada, que as conquistas não sejam minimizadas e que o idealismo não atropele a realidade, quando há tantos outros privilégios a se discutir. 

Porque não é fácil esquecer os dias em que você foi questionada sem razão aparente ou teve suas habilidades intelectuais postas em cheque, não é fácil esquecer dos ambientes de trabalho que mal tinham infraestrutura para te receber ou te causaram desconforto. Mas é mais fácil ao saber que absolutamente tudo que você está construindo vai possibilitar que alguém, no futuro, não passe pelo mesmo. E, para isso, é imprescindível que construam-se locais de trabalho que não meramente incluam mulheres, mas também proporcione uma permanência sadia. Que haja infraestrutura e possibilidades, assim como reconhecimento. É necessário que se diga para meninas que elas têm escolhas além do que já lhes incentivaram e que todos os ambientes podem e também devem ser delas. 

É, há tantas coisas para se trabalhar… Mas ano que vem, os números no começo de um texto como esse podem ser diferentes. E ainda melhores no seguinte. Quem sabe em 10 anos? Tudo pode mudar (e vai).

 

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será publicado.


*